domingo, janeiro 29, 2006

Amado Rei,

Sua descrição da cor cinza me fez pensar. Não consigo evitar uma alusão às pessoas. Tenho a impressão de que nós também somos cinza. Cinza formado da mistura de opostos, cinza que a cada nova experiência é acrescido de tonalidades, tornando-se mais brando ou ofuscante, porém... ainda cinza. Se assim for, seríamos todos iguais perante a olhos distantes e absurdamente diferentes à aqueles que apurarem a vista. Sim, cinza é mesmo uma cor incrível.

Minha platéia é mesmo real, posto que nunca duvidei de sua existência. Não há um só dia que não dedique à ela! Apresenta-se, realmente, diminuta. Porém fidedigna como nenhuma outra.
É claro que, humana que sou, não nego que me ponho à mercê de carências, procurando elogios, aplausos, antes mesmo de o espetáculo terminar. Ando meio assim, meio assado. Me assoma uma vontade de sentar-me junto à platéia e deixar que outros terminem o que comecei. Quero rir e chorar ao lado dos que amo, não à frente dos mesmos. [Creio que Vossa Majestade está conseguindo me compreender, já que vives em cima de um palanque].
Essa gente reunida para te prestigiar é realmente enervante, já essa expectativa...dá nos nervos.

Oh não, não conseguiria nem em mil anos me controlar. E nem o quero. Sabes, eu preciso de surpresas, novidades. Preciso acordar achando tudo indiferente, preciso adormecer achando tudo importante. Gosto muito dessa minha inconstância. Ela me excita a esperança.
Sentimento fulgaz, algo que me venha de supetão? Ora não me fales disso! Se me pego esperando, já não me surpreendo! Terei de concordar, embora, que tudo isso faz muito bem à alma.

Não sou adepta do arrependimento. Não acredito no mesmo. Arrependimento para mim é medo de aceitar o erro. É medo, de ter de aprender com o erro. Não, não me arrependo. O que tenho pensado, e muito, é nos verdadeiros objetivos que nos levam a fazer as coisas e suas possíveis consequências. Há um tempo que venho lhe falando da minha desconfiança por aqueles que se dizem altruístas. "Todo gesto, toda palavra, todo movimento desinteressado visando uma realidade fora da nossa é mais egoísta que o mais sórdido interesse.Porque nasce do orgulho e pressupõe um julgamento."
Não sei, muito controverso esse assunto. E acarreta, como agora, a vontade de descobrir o interesse em tudo, o interesse em escrever-lhe esta carta, o interesse em fumar um cigarro, o interesse em sentir saudades, o interesse em uma cerveja, etc. Chega, já estou me atrapalhando muito, esse é um tipo de avaliação para muitas mentes e eu prefiro preservar a minha, por enquanto.

Outro pensamento, de muito constante, acerca no tópico julgamento. Será que temos mesmo o direito de julgarmo-nos uns aos outros? Direito ou não, é inevitável. E delicado também, sabes que uma atitude julgada nunca se apresenta 'por certa'. E essas interpretações são as que definem o meio em que convivemos, com quem nos involvemos, como nos apresentamos, e tudo o mais.
Chego à conclusão de que viver é mesmo complicado, trabalhoso, delicado. E fascinante.

Com carinho e saudades,

Teresa.

*Agradeço a oferta de seus cavalos porém tendo a recusá-la. Prefiro caminhar, não vou com o intuito de apenas olhar o reino, e sim sentí-lo.